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ToggleEntenda por que a ausência de pró-labore pode ser vista como fraude e como evitar erros na distribuição de lucros.
1. Introdução
Para muitos empresários, a confusão entre dinheiro em caixa e lucro distribuível é comum. O sócio olha para o saldo bancário da empresa e entende que aquele valor já lhe pertence. A contabilidade, no entanto, mostra outra realidade: existem limites legais, fiscais e trabalhistas que determinam quando e como os lucros podem ser distribuídos. Mais ainda: há situações em que a distribuição de dividendos é simplesmente proibida.
O problema ganha contornos mais graves quando o empresário decide não fixar pro labore e retirar toda sua remuneração como “lucro”. Essa prática, embora sedutora por estar isenta de imposto de renda e INSS, pode ser caracterizada como fraude à Previdência Social e resultar em autuações pesadas.
2. Pró-Labore x Lucros: Naturezas Jurídicas Distintas
O pro labore é a remuneração do sócio pelo trabalho que desempenha na administração ou operação da empresa. Possui natureza salarial para fins previdenciários e fiscais, sendo tributado pelo INSS patronal e pelo IR na fonte.
Já o lucro é a remuneração do capital investido, decorrente do resultado econômico da empresa. Desde 1996 (Lei nº 9.249/95), sua distribuição é isenta de IR para o sócio pessoa física — desde que respeitados os limites legais.
Confundir essas duas figuras não é um simples detalhe: é ignorar que a lei faz distinção clara entre remuneração do trabalho e remuneração do capital.
Importante destacar: salvo disposição expressa em contrário no contrato social, apenas o(s) sócio(s) administrador(es) têm direito ao pro labore. Os demais sócios, que não participam da gestão, não podem retirar valores a esse título. Para esses, a remuneração ocorre exclusivamente pela via dos lucros/dividendos, proporcionais à sua participação societária ou conforme cláusulas contratuais.
Esse detalhe suscita outra questão prática: se somente os administradores podem receber pro labore, como ficam os sócios investidores, que não exercem funções de gestão? A resposta é que sua remuneração depende unicamente da distribuição de lucros, e jamais poderá ser “maquiada” sob a forma de pro labore. Isso reforça a necessidade de escrituração contábil fidedigna, pois somente ela permite identificar o verdadeiro lucro distribuível a cada sócio.
3. Posso Distribuir Lucros sem Pagar Pró-Labore?
Essa pergunta via de regra ecoa nos escritórios de contabilidade e de advocacia. Em tese, a lei não estabelece valor mínimo de pro labore. Porém, a jurisprudência e a Receita Federal entendem que, se o sócio exerce atividade na empresa, deve receber uma remuneração compatível com sua função.
A ausência de pró-labore, combinada com retiradas vultosas de lucros, é frequentemente interpretada como tentativa de mascarar salário como lucro. O fundamento está no art. 12, § 4º, da Lei nº 8.212/91, que vincula a condição de contribuinte obrigatório àquele que exerce atividade remunerada.
Em julgados recentes, tribunais confirmaram autuações contra empresas que, sem pagar pro labore, distribuíam 100% dos valores aos sócios como lucros. A prática foi enquadrada como fraude à Previdência Social.
4. A (Não) Obrigatoriedade Legal do Pró-labore
Um equívoco bastante comum no meio empresarial – e até entre profissionais do Direito e da Contabilidade – é afirmar que toda empresa é obrigada a pagar pró-labore aos sócios. Essa interpretação, no entanto, não encontra respaldo direto na legislação e nem mesmo na jurisprudência.
A Lei nº 8.212/91 (art. 12, V, f) e o Decreto nº 3.048/99 (art. 9º, V, f) estabelecem que o sócio que exerce atividade na empresa, e recebe remuneração pelo trabalho, é enquadrado como contribuinte individual da Previdência Social. Em complemento, o art. 201, §5º, II, do Decreto nº 3.048/99 determina a tributação mesmo quando valores são pagos a título de “antecipação de lucros” sem discriminação da parcela de trabalho.
Em outras palavras:
- Nenhuma legislação obriga expressamente o pagamento de pró-labore.
- O que a lei diz é: se houver remuneração pelo trabalho do sócio, sobre ela incidem contribuições previdenciárias.
- A chamada “obrigatoriedade” nasce, portanto, de uma interpretação prática: se o sócio trabalha na empresa, presume-se que deveria ser remunerado como administrador, e não apenas como investidor.
Portanto, esse detalhe é decisivo. O sócio que apenas aporta capital e não exerce funções de gestão não recebe pró-labore – sua remuneração se dá unicamente via lucros. Já o sócio que trabalha efetivamente na empresa pode até não fixar pró-labore, mas estará assumindo o risco de ver as retiradas de lucros requalificadas como remuneração encoberta, com exigência retroativa de contribuições.
Ademais, nem mesmo em relação ao sócio administrador existe, na lei, uma obrigação absoluta de fixação de pró-labore. A exigência é de natureza condicional: se houver remuneração pelo trabalho, incidirá contribuição previdenciária. Nas pequenas empresas, especialmente aquelas em fase inicial de atividade, é comum não haver recursos financeiros suficientes para sustentar o pagamento de pró-labore.
5. Limites de Distribuição de Lucros no Simples Nacional
No Simples Nacional, a regra é clara:
- Se a empresa mantém escrituração contábil regular, pode distribuir o lucro líquido contábil sem limites adicionais.
- Se não mantém, a distribuição isenta fica limitada a presunção da alíquota máxima do lucro presumido definido pela lei (base de cálculo menos tributos pagos).
Exemplo: uma empresa de serviços fatura R$ 100 mil. Sem contabilidade, poderá distribuir como isento apenas R$ 32 mil (32% do faturamento), ajustados pelos impostos pagos. Qualquer valor acima desse limite, sem contabilidade, será considerado distribuição disfarçada.
6. Limites de Distribuição de Lucros no Lucro Presumido
No Lucro Presumido, a lógica é semelhante:
- Lucros podem ser distribuídos até o limite da base presumida (8%, 16% ou 32%, dependendo da atividade).
- Para ultrapassar esse limite, é obrigatória a contabilidade regular que comprove resultado superior.
Sem escrituração, distribuições ilimitadas são vistas como pagamento encoberto aos sócios – e sujeitas à requalificação fiscal.
7. Quando a Empresa Não Pode Distribuir Lucros
Antes de distribuir lucros, a empresa precisa verificar se há impedimentos legais, fiscais, trabalhistas ou contábeis. Essa análise é fundamental para evitar riscos fiscais e até responsabilidade pessoal dos sócios.
São situações impeditivas a distribuição de lucros:
- Prejuízos acumulados;
- Dívidas fiscais, tributárias e previdenciárias (art. 32 da Lei 4.357/64);
- Parcelamentos fiscais e tributários em atraso (REFIS, PERT, entre outros);
- Dívidas trabalhistas, inclusive de natureza salarial;
- Patrimônio líquido negativo;
- Ausência de demonstrações contábeis regulares;
- Descumprimento de cláusulas do contrato social;
- Omissão do pró-labore quando devido;
- Débitos com fornecedores estratégicos que coloquem em risco a continuidade operacional;
Em resumo: antes de distribuir lucro, é preciso verificar se a empresa está em dia com suas obrigações fiscais, trabalhistas e previdenciárias.
8. Riscos da Distribuição Indevida
Os riscos não são meramente teóricos:
- Autuação fiscal com exigência de IR e INSS retroativos.
- Responsabilização pessoal dos sócios por dívidas (art. 135, CTN).
- Crime de apropriação indébita previdenciária (art. 168-A, CP).
- Ações de credores e reversão judicial das distribuições feitas.
A prática de distribuir lucros enquanto há passivos trabalhistas e fiscais pode ser interpretada como ato ilícito de gestão e até justificar a desconsideração da personalidade jurídica.
9. Boas Práticas para Empresas e Sócios
- Fixar pro labore compatível com a realidade do mercado e da função exercida;
- Manter contabilidade regular – única forma de ampliar a margem de distribuição de lucros com segurança;
- Deliberar formalmente as distribuições em atas ou registros societários;
- Verificar pendências fiscais, previdenciárias e trabalhistas antes de qualquer deliberação de dividendos; e
- Evitar a prática de “zerar” o pró-labore para tentar viver só de lucros.
10. Conclusão
Distribuir lucros sem critérios, ignorando pró-labore ou desconsiderando dívidas, pode parecer vantajoso a curto prazo, mas é uma armadilha perigosa. O empresário precisa compreender que lucro distribuível não é sinônimo de caixa disponível e que, antes de remunerar os sócios, a empresa deve estar em conformidade com suas obrigações legais.
O equilíbrio inteligente está em:
- Remunerar o trabalho do sócio por meio de um pró-labore justo e declarado;
- Distribuir lucros dentro dos limites contábeis e legais;
- Respeitar a ordem de prioridades imposta pelo direito trabalhista e tributário.
No fim das contas, a melhor forma de proteger o patrimônio empresarial e pessoal é seguir o que a contabilidade já mostra: só há lucro distribuível quando há resultado líquido positivo e nenhuma pendência capaz de comprometer sua legitimidade.
Distribuir lucros de forma equivocada pode gerar autuações fiscais e trabalhistas. Não corra esse risco. A Zannix Brasil Contabilidade está pronta para ajudar sua empresa a adotar a prática correta e segura. Fale agora mesmo com nossa equipe.